Quando procuramos
entender os conceitos da "batalha espiritual" a partir de princípios
gerais que controlam as diversas áreas abrangidas pelo tema, poderemos
ter alguns trilhos sobre os quais poderemos conduzir o assunto. No que
se segue, procuro analisar 02 desses princípios que têm importância
fundamental para ele: a soberania de Deus, a suficiência das
Escrituras.
1. Deus é soberano absoluto do seu universo
Um soberano é alguém
que está revestido da autoridade suprema, que governa com absoluto
poderio, que exerce um poder supremo sem restrição nem neutralização.
Quando dizemos que Deus é soberano, significa que ele tem poder
ilimitado para fazer o que quiser com o mundo e as criaturas que criou, e
que nenhuma delas pode, ao final, frustrar seus planos. Podemos fazer
algumas afirmações quanto a essa doutrina.
A soberania absoluta
de Deus sobre sua criação percebe-se claramente nas Escrituras. No
Pentateuco Deus revela-se como o Criador do mundo visível e invisível, e
da raça humana. Ele é o Libertador dos seus e o Legislador que
soberanamente passa leis que refletem sua santidade e exigem obediência
plena de suas criaturas. Ele exerce total controle sobre a natureza que
criou, intervindo em suas leis naturais, suspendendo-as (milagres).
Assim, em contraste com os deuses das nações, ele é o supremo soberano
do universo, acima de todos os deuses, que os julga e castiga, bem como
aos que os adoram. Nos livros Históricos, lemos como Deus cumpre
soberanamente suas promessas feitas a Abraão de dar uma terra aos seus
descendentes, introduzindo-os e estabelecendo-os em Canaã, e ali
mantendo-os até que os expulsasse por causa da desobediência deles. Os
Salmos e os Profetas celebram a soberania de Deus sobre sua criação e
sobre seu povo. É ele quem reina acima das nações e de seus deuses
falsos, quem controla o curso desse mundo. Nele seu povo sempre pode
confiar e depender.
O mesmo
reconhecimento encontramos nas Escrituras do Novo Testamento. Na
plenitude dos tempos Deus envia soberanamente seu filho, e dá testemunho
dele através de milagres poderosos, ressuscitando-o de entre os mortos.
Esses eventos, bem como os que se seguiram na vida dos apóstolos e da
Igreja nascente, ocorreram como o cumprimento da vontade de Deus
A soberania de Deus é
ensinada no conceito de Reino de Deus. Mas, é o conceito bíblico do
Reino de Deus que melhor expressa a soberania de Deus sobre o universo
que formou. Tal conceito está presente em toda a Bíblia e mesmo
estudiosos renomados têm insistido em que é o conceito central das
Escrituras, do qual se derivam todos os demais. Para colocá-lo de
maneira simples e sucinta, significa o domínio supremo de Deus sobre
suas criaturas, mesmo as que se encontram em estado de rebelião aberta
contra ele.
O próprio Satanás
está debaixo da soberania divina. Embora não esteja muito claro na
Bíblia, a Igreja cristã sempre entendeu que Satanás foi originalmente um
dos anjos criados por Deus, talvez um querubim de grande beleza e
poder, que desviou-se do seu estado original de pureza e motivado pela
vaidade e pela soberba, rebelou-se contra Deus, desejando ele mesmo
ocupar o lugar da divindade (Isaías 14 e Ezequiel 28). Punido por Deus
com a destruição eterna, o anjo rebelde tem entretanto a permissão
divina para agir por um tempo na humanidade, a qual, através de seu
representante Adão, acabou por seguir o mesmo caminho do querubim
soberbo. Pela permissão divina, Satanás e os demais anjos que aliciou
dos exércitos celestiais, cumprem nesse mundo propósitos misteriosos,
que pertencem a Deus apenas. Alguns deles transparecem das Escrituras,
que é o de servir como teste para os filhos de Deus e agente de punição
contra os homens rebeldes.
O ensino bíblico é
claro. Satanás, mesmo sendo um ser moral responsável e retendo ainda
poderes inerentes aos anjos, nada mais é que uma das criaturas de Deus, e
portanto, infinitamente inferior a ele em glória, poder e domínio.
Mesmo que a Bíblia fale do reino de Satanás e de seu domínio nesse mundo
(Ef 6.12; Lc 4.6; Jo 14.30) e advirta os crentes a que estejam alertas
contra suas ciladas (Ef 6.11; 1 Pe 5.8; Tg 4.7), jamais lhe atribui um
poder independente de Deus, ou liberdade plena para cumprir planos
próprios, ou capacidade para frustrar os desígnios do Senhor.
Assim, a Bíblia nos
ensina que Satanás não pode atacar os filhos de Deus sem a permissão
dele. Foi somente assim que pode atacar o fiel Jó (Jó 1.6-12; 2.1-7),
incitar Davi a contar o número dos israelitas (1 Cr 21.1 com 2 Sm 24.1) e
peneirar Pedro e demais discípulos (Lc 22.31-32). Os crentes têm a
promessa divina de que ele só permitirá a tentação prosseguir até o
limite individual de cada um (1 Co 10.13), o que só faz sentido se o
Senhor tiver pleno controle sobre a atividade satânica.
2. As coisas de Deus só podem ser conhecidas pelas Escrituras
Esse segundo ponto é
de importância crucial para nosso entendimento da batalha espiritual.
Ele trata da suficiência das Escrituras quanto ao conhecimento que
precisamos ter acerca de Deus, da sua vontade, suas promessas, e do
misterioso mundo celestial, onde invisivelmente se movimentam os anjos e
os demônios. Há dois aspectos que precisamos destacar aqui.
A exclusividade da Escritura.
A Bíblia é a única fonte adequada e autorizada por Deus pela qual obter
informações acerca das coisas espirituais e que pertencem à salvação.
Portanto, ela exclui qualquer outra fonte. Muito embora Deus se revele
através da sua imagem em nós (consciência, Rm 2.14-15) e das coisas
criadas (Rm 1.19-20), entretanto é através de sua revelação especial nas
Escrituras que nos faz saber acerca do mundo invisível e espiritual que
nos cerca. Assim, muito embora possamos depreender alguma coisa acerca
de Deus pelo conhecimento de nós mesmos e do mundo criado, é
exclusivamente nas Escrituras que encontraremos a revelação clara e
plena de Deus para a humanidade.
A suficiência da Escritura.
A Bíblia traz todo o conhecimento que precisamos ter nesse mundo, para
servirmos a Deus de forma agradável a ele, e para vivermos alegres e
satisfeitos no mundo presente. Mesmo não sendo uma revelação exaustiva
de Deus e do reino celestial, a Escritura entretanto é suficiente
naquilo que nos informa a esse respeito.
1) A única fonte
autorizada que temos para conhecer o misterioso mundo angélico onde se
movem anjos e demônios é a Bíblia. Mesmo que existam muitos conceitos e
idéias acerca dos demônios, advindas da superstição popular, da crendice
e de experiências pelas quais as pessoas passam, é somente nas
Escrituras que encontramos conhecimento seguro acerca de Satanás e de
sua atividade nesse mundo. Ela é singular e exclusiva.
2) A Bíblia contém
tudo o que Deus desejava que conhecêssemos a respeito de Satanás. O
ensino que ela nos oferece sobre os demônios e suas atividades é
suficiente para que possamos estar sempre prontos para resistir às suas
investidas e para ajudar as pessoas que se encontram cativas por eles.
Ou seja, tudo que precisamos saber para travarmos uma guerra espiritual
contra as hostes espirituais da maldade está revelado nas páginas da
Escritura, e isso inclui conhecimento das ciladas astutas do diabo e a
maneira correta de procedermos diante delas. A Bíblia é nosso manual de
combate espiritual. Ela nos revela o caráter de nosso inimigo, suas
intenções e artimanhas, e de que modo podemos ficar firmes contra suas
ciladas.
Os perigos que correm
os cristãos que adotam uma demonologia ou uma visão de batalha
espiritual que vai além dos padrões da Palavra de Deus são devastadores.
Via de regra, os que têm ido além das Escrituras acabam caindo numa
demonologia semi-pagã. Defensores dessa nova teologia mesmo apresentando
as vezes bom material bíblico são tendentes a especulações fantásticas e
imaginações espetaculares. Os que vêem a dor, o sofrimento, as doenças,
a depressão, o desemprego, os conflitos pessoais e o pecado — enfim,
toda a miséria que existe no mundo ao seu redor — sempre em termos de
batalha espiritual, correm diversos riscos quanto à sua fé.
Falsa compreensão.
Quando aceitamos a idéia de que vivemos num mundo onde todo mal se
origina na atuação direta de Satanás ou alguns de seus demônios,
perdemos de perspectiva o ensino bíblico de que somos responsáveis pelos
nossos pecados e pelas conseqüências dos mesmos, que geralmente nos
trazem dor e sofrimento. E podemos até mesmo começar a questionar se a
disciplina espiritual é de algum valor para quebrarmos o poder dos
hábitos pecaminosos em nossas vidas, já que acreditamos que estes se
resolvem pela expulsão de entidades espirituais responsáveis pelos
mesmos.
Temor doentio.
Pessoas que percebem a vida cristã exclusivamente em termos de batalha
espiritual, logo começam a ver conexões sinistras e macabras entre os
eventos do dia a dia e a atividades de demônios, o que pode levá-las ao
pânico ou a um comportamento paranóico.
Ilusão.
Pessoas que experimentam umas poucas vezes a "vitória" sobre o inimigo
podem adquirir uma falsa sensação de superioridade, de orgulho ou a
ilusão de terem "poder". Entretanto, a vitória pertence a Deus. Devemos
nos lembrar que a maioria dos problemas que os cristãos experimentam
procedem de suas próprias faltas, defeitos, incoerências,
idiossincrasias e enfermidades espirituais. Não estou negando que
Satanás usa essas coisas para prejudicar nossas vidas, apenas destacando
que elas tem origem em nossa natureza decaída.
Se porém
permanecermos confiantes na exclusividade e na suficiência do ensino da
Escritura e permanecermos firmes no que ela nos ensina, poderemos entrar
no combate espiritual perfeitamente equipados e tendo a perspectiva
correta do que está acontecendo. Esse é um princípio fundamental que
devemos manter a todo custo quanto ao tema da batalha espiritual.
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